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Mesmo em uma cidade de médio porte como Jaraguá do Sul, a rotina pode ser estressante. Estudos, agenda cheia e muita pressão no trabalho. Dorme tarde, levanta bem cedo e começa tudo de novo. Os dias de Eduardo Schäffer eram assim. Muitos compromissos com os outros, poucos com ele mesmo.
Mas faz 6 anos que isso mudou. A vida se encarregou de algumas barreiras que ele decidiu saltar, usando esse impulso para alcançar mudanças significativas para ter uma vida mais leve, bem do jeito que ele queria.
Hoje, não é clichê dizer que o escritório de Eduardo é na praia, afinal, o mar do Rosa fica quase no quintal de casa. É da conexão com a natureza que vem toda a energia e alegria de viver com simplicidade, estilo de vida que divide com a companheira Camila Cassiano.
Antes da mudança
Jaraguaense nascido no Hospital e Maternidade Jaraguá, ou melhor, no “Hospital do Morro”, Eduardo passou pelos colégios tradicionais da cidade: Evangélico, São Luís e Divina Providência.
Sempre gostou de estudar e a influência do pai, empresário do ramo metalúrgico, o levou naturalmente para o meio.
Mas isso foi bem cedo: ao terminar o ensino médio, após um intercâmbio para um curso intensivo de inglês na Califórnia, a trajetória profissional começou.
“Assim que terminou as aulas do terceiro ano, em 1997, nem tive tempo, quando meu pai comunicou que havia comprado uma pequena empresa e eu iria começar a trabalhar. Era uma franquia dos Correios”, conta.
Como incentivo, Werner Schäffer colocou o filho na função de administrador e deu uma participação na sociedade.
“Imagina, um jovem de 18 anos, recebendo tamanha responsabilidade. Claro, cometi erros, aprendi muito, até que a empresa começou a dar retorno e ser um case de sucesso, muitos anos depois”, ressalta.
Posto cedo nessa rotina empresarial, o caminho acadêmico foi Administração, que cursou na Católica, e depois especialização na FGV em Gestão Empresarial e Finanças, cursos na área de gestão, investimentos, vendas e outros.
Do sucesso de gestão a um ambiente inviável
Foram 15 anos a frente da franquia dos Correios, localizada primeiro na rua Domingos Sansom e depois, nos últimos três anos, na Waldemar Grubba.
O aprendizado foi grande e sempre teve apoio do pai, da mãe, Jany Rose Chandohá, dos irmãos e colegas de trabalho.
“A equipe era unida, e sentíamos a satisfação dos nossos clientes. O resultado não demorou a chegar. E no último ano de operação, já éramos a maior agência da cidade”, relembra.
Esse ritmo de crescimento sofreu um baque em 2002, segundo Eduardo. Ele conta que o novo governo começou a dificultar o trabalho das franquias de olho no mercado que essas agências haviam conquistado.
O jaraguaense afirma que a rede nacional de franqueados tinha chegado a atingir 40% da receita bruta dos Correios, sendo estas apenas 10% das agências do país.
O novo modelo de franquia imposto na época trazia muita insegurança jurídica, segundo Schäffer, inviabilidade econômica e alto risco de investimento, excluindo então as franquias menores e mais vulneráveis. Eram jogadas políticas e muita competição.
“Foi um golpe, muito bem arquitetado. Tem coisas que muita gente não sabe, e eu não posso falar. Isso tudo me fazia querer mudar, sair deste ambiente desonesto, corrupto. Em 2012 fechou 700 franquias em todo o país. Não é à toa que hoje os Correios só dão prejuízo e fornece um serviço ruim, de péssima qualidade”, acredita.
Hora de recomeçar
Eram tantos os desencontros entre o que o governo federal trazia e as diretrizes que Eduardo mantinha que não havia outra decisão senão encerrar as operações em 2002. Era um “fim de carreira” aos 33 anos.
“Não era um ambiente saudável para se viver, nem trabalhar. Isso me incomodava muito. Era um jogo de ganha-perde, não uma parceria”, comenta.
Dali em diante, alguns conceitos de vida que já estavam ganhando espaço na vida do ex-empresário começaram a se firmar. Anos antes, quando estava com 24 anos, o surfe já havia trazido mudanças.
“Era 2003 quando comecei a pensar mais na vida e no que eu realmente queria para mim. Passei a cuidar mais da saúde, larguei o cigarro, mudei a alimentação e passei a estar mais perto do mar. Quando você começa a surfar, você passa a ter mais contato com a natureza, e isso te transforma”, revela.
Com a empresa fechada, a decisão foi buscar uma nova vida e novos ares na praia. A primeira parada foi Balneário Piçarras.
Conhecimento transformador
O processo contribuiu com a chegada de novas conexões e o caminho estava aberto para novos conhecimentos integrarem essa jornada.
“Vendo tudo que eu estava passando, um amigo me apresentou o Budismo, e me presenteou com um livro sobre o assunto. Estavam ali as respostas que eu tanto buscava. A raiz de todo sofrimento é o apego. Apego às coisas materiais, ao dinheiro, as pessoas, ao status e ao próprio Eu”, compartilha.
Um dos momentos transformadores, conta, foi quando ele e a companheira participaram de um retiro de meditação Vipassana em 2012, na Montanha Encantada, em Garopaba.
“É o maior centro de Yoga da América Latina, e possuem diversos programas ao longo do ano, e tem um que eu recomendo a todos: o Retiro Vipassana com o professor Ricardo Sasaki. São 7 dias de imersão a natureza e ao Eu interior, com palestras, sessões de meditação e yoga, alimentação vegetariana e tempo livre para reflexão. Tudo isso em meio a natureza, num ambiente puro e natural, em silêncio absoluto. Isso foi transformador”, ressalta.
Outro retiro com o mesmo professor aconteceu em 2014, em Brumadinho, Minas Gerais, na escola Theravada, a mais clássica entre as 22 escolas budistas do país.
Aprender sobre o desapego e se aprofundar nas técnicas de meditação foram fundamentais para conseguir ver a vida de outra perspectiva.
“A gente deve estar sempre aberto a novas experiências, nunca ficar apegado a uma crença ou uma metodologia, um padrão ou superstições. Quando estamos abertos, expandimos nossa mente, nos tornamos mais sábios, questionamos mais. Por isso não acredite em tudo, pergunte sempre, é assim que aprendemos. Desconfie do sistema, está cheio de armadilhas”, aconselha.
Lar doce praia
Haviam sido dois anos sabáticos de estudos pessoais.
Com ferramentas que abriram novas perspectivas, Eduardo e Camila chegaram na Praia do Rosa, em 2015, prontos para viver mais com muito menos.
E os fatores para garantir que encontraram o lugar certo para viver são muitos, e Eduardo enumera: é a capital da baleia franca, terra das melhores ondas do Brasil, na região fica no maior ecossistema lagunar costeiro do mundo e está a poucos quilômetros de Florianópolis.
“A região tem muitas histórias, relatos dos primeiros espanhóis datam de 1525, mas foram os hippies e surfistas nas décadas de 60 e 70 que exploraram o local e fizeram deste lugar uma zona livre de preconceitos, intolerâncias e estilo de vida com menos apego e mais liberdade. Vive-se bem, com simplicidade, mas com mais liberdade. Essa é a nossa riqueza”, afirma.
A vida no Rosa facilita muito essa dinâmica. Ainda mais porque a atmosfera de quem vive lá é a mesma. O que importa mesmo é estar bem e feliz.
“Você vai no mercado com a roupa que está, de chinelo, e ninguém liga para isso. Na cidade é diferente, tem que estar sempre muito bem vestido, carro do ano e participar de todos os eventos. Vive-se correndo, com muitos compromissos”, destaca.
Despertando outros dons
Toda essa caminhada com menos peso nas costas fez Eduardo e Camila se abrirem também para novas possibilidades de trabalho e explorarem seus potenciais.
Camila já conhecia seu talento para a costura quando vivia em Jaraguá do Sul, mas sobrava pouco tempo para explorar.
Na praia as inspirações vieram e o artesanal foi mais reconhecido, dando força para a marca Carambola. Ela também trabalha na ONG Jogue Limpo, que cuida de toda organização e limpeza da praia.
Já a experiência administrativa e o conhecimento do ramo imobiliário chamou Eduardo, que hoje trabalha como corretor de imóveis autônomo, tendo um site próprio para atender clientes de todo o país.
Apostando no potencial turístico da região, neste ano começou a trabalhar no projeto Surfland. Um grande empreendimento imobiliário: um resort que terá uma praia artificial com ondas profissionais.
Rumo à sustentabilidade
Uma casa pequena, com o suficiente. Quintal amplo, cheio de galinhas – cada uma tem seu nome, afinal, são todas de estimação. Elas fornecem os ovos e uma pequena horta abastece o casal com verduras, alguns chás e temperos.
Tem árvores frutíferas, poço com água viva vindo direto do lençol freático. O pulmão se enche de ar limpo a cada respiração.
Como Camila conhece de farmácia natural, a maioria das dores que aparecem são curadas com ervas medicinais. Mas alimento, ar e água pura são os melhores remédios.
“Só falta gerar a própria energia, que é o nosso próximo passo. Nosso sonho é ter um pequeno sítio e ser o mais auto suficiente possível, com menos conta para pagar e mais tempo livre, ter comida de verdade e menos produtos químicos”, declara.
A vida leve também levou a essa vontade de cultivar os alimentos e cuidar do meio ambiente, deixando de lado a comida industrializada. Um estreitamento com a natureza.
“Precisamos de equilíbrio e resgatar o que se perdeu. Hoje tudo é sintético, polui e faz mal para nós e para o meio ambiente. Não me parece algo sustentável, puro e verdadeiro”, destaca. “Não podemos fugir da verdade, da razão e do ambiente em que vivemos. Afinal, somos racionais, destruindo nosso próprio habitat?”.
É preciso desapegar para se reconectar
Eduardo é enfático ao dizer que o maior desafio da mudança é desapegar. Infelizmente, ele acredita que a maioria das pessoas vive no piloto automático, nutrindo status social, luxos, sem realmente pensar por si próprios.
“A pergunta é se as pessoas estão dispostas a ter uma vida mais simples, com menos vaidade, poucos compromissos e mais consciência”, reflete. “A vida passa muito rápido, e deixamos de viver nossos sonhos para viver o sonho dos outros. Quando somos autênticos e temos foco no que realmente queremos, vivemos melhor, com mais leveza e menos preocupação”.
Para quem sente vontade de trilhar um caminho de mudança, o ponto de partida é sair um pouco da rotina para enxergar as coisas de uma outra forma.
O jaraguaense aconselha as pessoas a buscarem ferramentas para se conhecerem melhor e resgatarem a essência da vida.
A simplicidade, acredita, é o mais alto grau de sabedoria. “Saber viver com pouco é o segredo para a felicidade”, pontua.
É preciso ainda otimizar o tempo, organizar a vida financeira, consumir pouco mantendo o conforto, se planejar desde cedo para o futuro e evoluir espiritualmente.
“O importante é não ter sofrimento. Se você está contente com a sua vida, então está tudo bem, não importa aonde e nem o que esteja fazendo, o que vale é ser feliz e grato pela vida”, finaliza.
Sobre o artigo que você leu
“Larguei tudo para…” é uma série que conta as histórias de pessoas que tomaram a iniciativa de deixar um caminho seguro para perseguir um sonho. Aqui vamos compartilhar muita inspiração, experiências, perspectivas interessantes e disrupção. Conhece alguém com uma história legal?
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