Compartilhe este conteúdo agora:
A história de Karina Pescharki, 26 anos, é daquelas que mexem com o coração. Fazem perceber que as barreiras da vida podem paralisar ou fortalecer, tudo depende da forma de encarar.
Diante da amputação da perna esquerda, há dois anos, essa jaraguaense decidiu atravessar as barreiras e seguir em movimento.
Hoje, nas redes sociais, com mais de 14 mil seguidores, ela virou inspiração de autoestima, estilo de vida e positividade. Mas chegar a esse lugar de profunda aceitação e entendimento consigo mesma foi uma jornada repleta de desafios, desde a infância.
Desafios de uma vida
Karina nasceu em janeiro de 1995 com a chamada síndrome de Klippel-Trenaunay e também uma malformação medular. Além da raridade da síndrome, o fato de ter o problema medular tornou o caso dela ainda mais incomum.
Logo após o parto, a mãe percebeu que a recém-nascida tinha uma perna mais volumosa do que a outra.
“E aí começou, sempre em busca de especialistas, tratamento, mas infelizmente nada era feito, nunca teve um tratamento correto, apenas acompanhamento”, comenta a jovem.
Apesar dessa diferença entre uma perna e outra, Karina tinha uma vida normal – andava, jogava bola, corria, como qualquer criança.
“O meu primeiro problema, que mudou tudo, foi quando tive uma convulsão na escola, fazendo dança”. Na tentativa de entender o que havia acontecido, um procedimento de retirada de líquido da medula de Karina, no hospital, a levou a perder os movimentos da perna.
Com isso, ela começou a andar com muleta e a perna esquerda foi atrofiando, o pé ficou torto. Além de estar com locomoção comprometida, a pequena Karina passou a se sentir diferente. Passou a se esconder.
“Eu sempre usava calça larga, minha mãe sempre comprava dois calçados porque eu usava 39-40 e na perna normal usava 37”, comenta.
Foram anos de fisioterapia, mas sempre usando muleta, sem recuperar o movimento. Por volta dos 16 anos, Karina sentiu vontade de entender melhor o problema que afetava sua vida, queria encontrar mais pessoas com a síndrome e encontrou um grupo no Facebook.
“Conheci várias histórias e nenhuma delas perdeu o movimento, então eu ainda tinha esperança que minha perna fosse voltar. Que tivesse algum tratamento e que eu pudesse voltar a andar”, relembra. “Eu sempre quis ser perfeita, eu sempre pedi para ser perfeita e não entendia porque eu tinha que ser assim”, comenta.
A gravidez improvável
Sempre foi dito que Karina não poderia ter filhos. Mas contrariando as possibilidades, com 21 anos ela engravidou da Valentina. A gestação seguiu bem, o parto também e lá estava ela, com a filha nos braços.
Mas dois ou três meses depois de dar a luz, Karina começou a sentir a perna fraca. A pequena “boa”, a direita. Cansava muito fácil e começou a achar estranho. Passava muito tempo na cadeira de rodas por não conseguir se sustentar em pé.
Como anos atrás tinha descoberto um especialista em São Paulo, ela fez uma grande campanha para conseguir recursos para pagar consultas e exames particulares.
“Deu que eu tinha um problema medular e era por isso que minha perna estava querendo parar”, conta. O tratamento era caríssimo e tinha 1% de chance de dar errado.
Karina decidiu não se arriscar, mesmo diante do risco de ficar paraplégica com o tempo.
Os anos mais difíceis
Se até aqui a história de Karina já parece uma saga, foi a partir de 2017 que as dificuldades se intensificaram.
Um dia, enquanto cuidava da filha na cama, teve uma fratura na perna esquerda. Como não tinha movimento, nem chegou a sentir dor. Foi levada ao hospital, onde fez uma cirurgia bastante delicada.
Voltou para a casa e começou a recuperação de 3 meses na cadeira de rodas. Nesse meio tempo, com a perna parada, uma trombose começou a se desenvolver – acostumada com as infecções na perna, Karina não percebeu.
“Eu só fui perceber mesmo que tinha alguma coisa errada quando tinha chegado no pulmão. Eu estava sentindo falta de ar e muita dor nas costelas”, conta.
Foi quando decidiu ir ao hospital, fez os exames, mas não apareceu nada. Mas em casa, o problema foi se agravando até chegar a um estado crítico.
Karina estava com embolia pulmonar e ficou dias entubada em coma. Foi um baque para toda a família. Mas Karina foi se recuperando.
Mesmo vencida essa batalha, o retorno para casa não representou o fim dos problemas. A cicatrização da perna não estava acontecendo, mesmo um ano depois da fratura.
A falta de movimento na perna fazia com que o osso não conseguisse se recuperar e os problemas vasculares faziam os sangramentos constantes se tornarem perigosos para a saúde da jovem.
Os médicos começaram a falar em amputação, mas ela tentava estratégias, indo para consultas em São Paulo.
Nesse meio tempo, Karina já tinha começado um processo de aceitação. Voltando a mostrar a perna, usar shorts e falar do seu problema de saúde nas redes sociais.
“Fiz um ensaio fotográfico, as primeiras fotos que estão lá são com a minha perna. Fiz um ensaio, postei, de shorts e tal,. Quando me falaram da possibilidade de fazer a amputação, me deu um medo porque eu achava que tudo que eu tinha feito para me aceitar, eu achava que essas coisas só aconteciam comigo”, conta. “Foi bem difícil”.
Hora de decisão
Ao perceber que não tinha mais melhora na perna, Karina decidiu encarar a situação. Iria amputar a perna. Pediu para ser internada alguns dias antes para receber sangue e estar bem.
“Em julho de 2018 foi feita a amputação. Só que quando eu achei que os problemas realmente já tinham acabado, que a amputação era o final, que iria dar tudo certo, depois de receber alta do hospital eu comecei com crises de hemorragia. O meu coto não cicatrizava e os pontos abriam e ficava ferida”.
De julho até dezembro, Karina ficava entre a casa e o hospital. “Ali realmente eu achei que eu iria morrer, porque deu para ver que o médico já não sabia mais o que fazer”.
Foi em dezembro de 2018 que foi trazido um médico de fora que foi capaz de parar o sangramento, levando a cicatrização.
“Já são quase 3 anos bem tranquilos, fazendo acompanhamento. Mas foram momentos bem difíceis”.
- Força da filha e distração no aprendizado
Nesse vai e vem entre hospital, ela conta que o apoio de profissionais de saúde mental foi muito importante. E também a compreensão. A direção do hospital deixava a filha, de apenas um ano, visitar Karina, mesmo sendo proibida a entrada de crianças.
“O principal desafio em tudo isso foi não desanimar, sempre tentar ver um lado bom em tudo isso e com certeza a Valentina ter me ajudado. Ela tão pequenininha me deu tanta força, fez com que eu continuasse e não desistisse tão fácil”.
Karina nunca conseguiu trabalhar formalmente por conta das dificuldades de mobilidade, mas foi num curso profissional de maquiadora que ganhou de uma amiga que encontrou uma atividade que ajudou muito no processo de recuperação.
“Eu treinava em casa e isso fez com que ocupasse minha cabeça bastante também”, diz. “Com isso eu também conseguiu ser uma maquiadora profissional”.
Novos desafios
Depois da amputação, Karina conta que se sentiu desconsolada. Ela não conseguia fazer coisas do dia a dia que antes era acostumada por ter perdido o equilíbrio.
“Eu precisava de ajuda, e isso me desanimou porque eu achava que tinha feito besteira de amputar a perna”.
Aos poucos, a fisioterapia e as idas à academia foram voltando a dar autonomia para ela, que passou a ver sua situação com um novo olhar, com positividade.
“Tudo isso que acontece eu sempre fui postando nas redes sociais, desde do hospital, e com isso eu recebi muita força de muitas pessoas por mensagem. Isso me ajudou muito”, comenta. “Eu postando as minhas coisas, mostrando o que eu faço sem uma perna, que eu faço academia, que eu faço as minhas coisas, limpo a minha casa, cuido da minha filha, fazendo coisas tão simples, que qualquer pessoa faz, inspira tantas pessoas. E o quanto elas me dão força com as palavras delas também”.
Agora o processo de reabilitação também segue com a possibilidade de Karina conseguir caminhar com a prótese, conseguida através de uma campanha.
Mas mais do que “colocar uma prótese”, existe todo um difícil processo de recuperação para funcionar – que é particularmente desafiador para Karina, que está há muitos anos sem movimento do lado esquerdo.
Mas a jovem olha isso como possibilidade, não como algo que precisa para ser feliz. “Não quero que seja isso que me desanime. Não quero que a prótese seja algo que falte em mim para me sentir bem”.
Lições de vida
Karina conta que a principal lição de todos esses desafios de vida foi a ideia de perfeição.
“É tudo no tempo de Deus. Ele me deu uma perna, querendo ou não, em que eu posso usar o sapato que eu quiser”, diz. “Tudo que eu sempre quis aconteceu. Consigo usar sapatos, tenho uma perna nova, mas precisei passar por tudo isso e não era como eu imaginava”.
A resiliência também virou combustível para Karina se sentir bem consigo mesma e conseguir passar isso para os outros.
“Eu me amo muito como sou hoje, vejo como sou forte por ter passado por tudo isso e quero inspirar muitas pessoas, mostrar, falar sobre tudo isso que eu passei e mostrar que todo mundo é forte e quando quer alguma coisa tem que correr atrás”.
Não esqueça de compartilhar:
Caixa de comentários
VOCÊ TAMBÉM VAI QUERER LER