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Uma salinha em casa na década de 30, uma majestosa e moderna loja na Marechal Deodoro da Fonseca nos anos 90 e o honrado fim com a ascensão da era digital. Fechada desde 2005, a Foto Loss virou uma boa lembrança para Jaraguá do Sul. É assim que acontece quando se marca uma época.
Até hoje, Waldemar Behling, 81 anos, é chamado de “seu Loss” pelos quatro cantos da cidade. “Aqui em casa quem ganhou o sobrenome fui eu, não minha esposa”, comenta.
O engano é honesto, afinal, seu Waldemar entrou para a família de corpo e alma. No trabalho e no amor. Isso porque nos primeiros anos no atelier fotográfico, entre câmeras e revelações, conheceu Rosemary, filha do fotógrafo que o havia contratado, João Rudolfo Florencio Loss, fundador da Foto Loss.
A história, desde o início, foi de crescimento em família. Tanto é que hoje Waldemar e Rosemary podem viver com tranquilidade seus dias: mantiveram um negócio de sucesso, criaram os dois filhos, se dedicaram a trabalhos voluntários e conheceram mais de 50 países, nos cinco continentes.
As viagens ainda fazem parte da rotina do casal, mas com uma intensidade bem menor. “A gente aproveita a vida, mas não pode aproveitar mais tanto”, brinca Waldemar, bem humorado, sobre a idade dos dois.
Waldemar narra com entusiasmo os anos de trabalho e a casa é recheada dessas boas lembranças: pelas paredes os prêmios por bom atendimento, marcos de cada década a frente da loja e um vasto acervo de equipamentos que ajudam a narrar a história de evolução da fotografia.
Amantes da fotografia
A história da Foto Loss é narrada com muito entusiasmo por Waldemar. E tudo começou, como ele conta, com o sogro João Rudolfo partindo de Curitiba com uma máquina fotográfica – daqueles caixotes de madeira – embaixo do braço.
Pegou o trem rumo a Blumenau, mas o trajeto exigia uma parada em Jaraguá do Sul, onde alguém o convenceu a tentar a sorte por aqui.
Ele começou a prestar serviços fotográficos, conheceu a esposa Olga, teve a filha Rosemary, construiu uma casa na esquina da Marechal com a Quintino Bocaiúva e, em uma salinha, instalou o Photo Atelier Loss em 1933.
Enquanto João Rudolfo seguia seu caminho se consolidando com a fotografia, um jovem Waldemar dava os primeiros passos – literalmente, porque ele nasceu em 1938 em Corupá.
Quando estava com 8 anos, se mudou com a família para Jaraguá. O pai Albrecht Behling era um empreendedor na época, criava vários negócios, mas dificilmente se mantinha em um, conta Waldemar.
Ele, ainda criança, lembra da primeira fotografia que tirou, com 11, 12 anos, de seu caminhão de madeira de brinquedo usando a máquina do irmão mais velho. O gosto pela foto despertou ali e anos depois ele já estava fazendo cursos por correspondência, que eram bem comuns.
Mas ser fotógrafo não veio assim como profissão. Waldemar conta que apesar da famíla ter uma boa condição financeira, ele queria muito trabalhar. Aos 14 anos foi garçom no antigo Bar Catarinense e depois foi para a labuta numa casa comercial que ficava na Procópio.
A história dele com a Foto Loss se cruza nessa época. O pai Albrecht na época tinha uma caminhonete muito bonita e transportava as pessoas do interior que queriam casar, as cerimônias aconteciam no centro.
“Era ir no cartório, na igreja, depois no fotógrafo e depois tomavam um café, em frente ao Foto Loss tinha um café. No fim eles compravam foguetes na Casa Schmitt e uns licores e iam embora. Esse era o casamento”, comenta Waldemar.
Numa dessas conversas, João Rudolfo atarefado pelo movimento constante e sem condições de atender tanta gente sozinho reclamou que não tinha alguém para o ajudar. Foi aí que veio a sugestão de contratar Waldemar, um jovem entusiasta das fotografias.
“Eu comecei a fazer esse curso quando eu trabalhava na casa comercial e comecei a revelar os filmes. A base eu tinha. Seu Loss me entrevistou e achou que eu tinha condições. Eu era uma pessoa jovem, tinha 17 anos, e com muita vontade de fazer as coisas, de crescer”, relembra. Isso era o ano de 1955.
Foto colorida: a primeira revolução
Quem queria tirar fotos naquela época, normalmente precisava ir no fotógrafo. Waldemar lembra que na década de 50 em Jaraguá do Sul, ou você iria no Foto Loss, ou no Foto Piazera.
Na estúdio, a máquina de corpo de madeira com um tripé, um espaço de 4 por 6 com cenário que dava para tudo: casamento, comunhão, batizado, foto de documento.
O movimento era tanto, que Waldemar e seu João Rodolfo chegavam a atender até 20 casamentos em um fim de semana. Não tinha família que eles não conhecessem.
Um ano depois de entrar na Foto Loss, uma mudança bem grande na rotina. Waldemar foi servir a Polícia do Exército do Rio de Janeiro.
O que ele não imaginava foi a oportunidade que se abriu de trabalhar com fotografia por lá – ele era responsável por cobrir todas as reportagens de fatos relacionados ao exército na cidade.
“Eu sempre estava na rua fazendo a cobertura de um acidente, de uma arruaça. Eu tinha que aprender a fotografar a noite, com flash. Eu fui evoluindo e evoluindo e o batalhão deu essa oportunidade, eu fiquei quase 12 meses sem voltar para casa”, comenta.
Por lá ele também teve a oportunidade de conhecer as fotografias coloridas à mão. Ainda não existiam filmes coloridos, era preciso fotografar preto e branco, fazer uma miragem em sépia e depois preencher com tinta óleo e ir refinando o trabalho.
Ávido pelas cores, só em 1958, já em Jaraguá do Sul e casado com Rosemary, que soube de um fotógrafo em São bento do Sul que ensinava a técnica. Aprendeu em um mês e trouxe para a cidade.
“E isso foi uma revolução no Foto Loss, porque ninguém sabia o que era colorido. Fiz uma exposição só de fotografias coloridas e ninguém acreditava. Era tudo a mão”, relembra.
Com o passar dos anos, Waldemar foi assumindo mais e mais a administração e João Rudolfo, com a idade, se afastando dos negócios. Em 1968 ele faleceu, deixando a sociedade entre o genro e a viúva Olga.
Revelação em uma hora!
Depois vieram filmes coloridos também e cópias coloridas, com máquinas ainda rudimentares. Um grande boom aconteceu na década de 80.
“Comprei as máquinas importadas da Fuji, que eram bem mais práticas, você fazia tudo em uma máquina só, mas o tamanho era 10×15. Mas pensa a propaganda que eu fiz: foto veloz. Revelou seu filme em 1 hora. Ninguém acreditava, imagina. Antes eram 3, 4, 5 dias”, conta,
O crescimento era acelerado, tanto quanto o volume de trabalho. Mais e mais pessoas foram integrando a equipe com o passar dos anos. Tanto que a família pode construir o prédio, que abrigou a loja na sua maior versão, com recursos da fotografia.
“Tudo dava certo, porque o empenho meu, da equipe, da minha esposa junto sempre, a gente só queria crescer”, garante. “A gente foi acompanhando o crescimento, também industrial. Eu sempre pensava: eu preciso estar à altura desse desenvolvimento”.
No passo da tecnologia
A Foto Loss já tinha sua moral quando o assunto era fotografia. Então outros produtos começaram a surgir para serem agregados, primeiros umas fitas cassetes, até que vieram os aparelhos eletrônicos.
“Ai um dia os revendedores me disseram: porque não vende televisão também. Quem sou eu para vender televisão? Naquele tempo era o Breithaupt que vendia televisão. Mas aí eu analisei, analisei. E pensei que têm que começar”, diz Waldemar.
Ele criou então consórcios para vender televisão, uma venda cooperação. Eram criados grupos de 24 pessoas e durante os meses as pessoas pagavam mensalmente, uma era entregue por sorteio e havia um por lance por mês.
“Não tinha taxa administrativa, era o preço da época calculado em 24 vezes. Aí eu vendia muito e as pessoas me procuravam, eu tinha uma credibilidade tão boa que ninguém duvidava que iria receber o produto”, destaca.
Logo, quando todo mundo tinha sua televisão, vieram aparelhos de som, instrumentos musicais e, anos depois, os celulares. A tecnologia começou a integrar a rotina da Foto Loss, que nos meados dos anos 90 ocupava uma loja de esquina no Calçadão.
“A gente estava com um dos estabelecimentos mais bem montados do Sul do Brasil na área de fotografia, informática, instrumentos musicais, áudio e vídeo. Nossa loja era muito linda, móveis todos de mogno”, relata Waldemar.
Era digital e o fim da revelação
Ninguém poderia imaginar como a relação das pessoas com a fotografia iria mudar tanto com a popularização da fotografia digital. Foram mudanças muito grandes e muito rápidas, lembra o empresário.
“Dentro desse espaço de tempo, de 2002 a 2003, 2005, houve uma queda muito grande na área do laboratório que nós tínhamos e meus equipamentos eram todos analógicos. Os laboratórios, as câmeras fotográficas. Tudo para filme”, comenta.
Os 30 funcionários que a empresa chegou a ter na loja de esquina foram sendo gradativamente dispensados. Em 2003, a loja deixou o espaço e ficou em uma sala menor ao lado.
Waldemar chegou a cogitar comprar uma máquina de revelação de fotos digitais lançada na época, mas custava R$ 500 mil.
“Mesmo aqueles que chegaram a comprar o laboratório digital, não conseguiram sobrevier. As pessoas se enganaram que iria continuar o mesmo ritmo de revelações em papel depois de digital e não aconteceu mais. E não aconteceu mesmo”.
Em 2005, a loja de instrumentos musicais, áudio e vídeo já estava com a filha de Waldemar e ele e o filho gerenciavam juntos a área de fotografia. E, mesmo com uma tristeza no coração, decidiram que era hora de parar.
Nas horas vagas
Na casa de Waldemar Behling, um verdadeiro museu. Estantes exibem centenas de câmeras fotográficas de várias épocas, filmadoras, máquinas de projeção. Todo o acervo, de uma trajetória de vida, ele vai doar para o Museu Emílio da Silva.
Uma ação que faz todo sentido olhando a doação do empresário à comunidade: foi presidente da CDL, da Comunidade Evangélica Luterana, membro dos conselho do Hospital e Maternidade Jaraguá, da Scar, do Cejas, Comitê de Trânsito e por aí vai.
Sua principal interação, no entanto, é com o Rotary Club. Membro desde 1968, foi presidente e governador distrital por duas oportunidades.
Toda essa atividade rendeu o título de cidadão honorário, recebido na Câmara de Vereadores em 2019, recebido como um presente por ele.
“Eu tenho um passado que me orgulha daquilo que eu fiz. A sociedade me deu oportunidade de crescer na vida com o trabalho meu e dos meus colaboradores, mas eu devolvi a sociedade, por isso eu me orgulho e posso dizer que cumpri a missão” finaliza.
Sobre o artigo que você leu
“Como vai você?” é uma série sobre o reencontro com personagens que se tornaram conhecidos em nossa região. São pessoas de quem lembramos vez ou outra, e agora queremos chamar para bater um papo e saber como estão. Você tem um nome para sugerir?
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