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Os jaraguaenses que trafegam pelas ruas Jorge Czerniewicz, Adélia Fischer e Max Wilhelm certamente precisam atravessar a ponte Doutor Abdon Batista para acessar o Centro. A estrutura já foi a única porta de entrada na cidade e é batizada com o nome do médico baiano, que também dá o seu nome a uma importante escola da cidade. Hoje, a série “Antigamente em Jaraguá do Sul” vai buscar a história que está encravada entre os pilares deste importante acesso viário.
Para mostrar a intensa relação dessa ponte com o desenvolvimento do município, é necessário voltar no tempo, ainda na época da colonização das terras da então Colônia Jaraguá.
A primeira grande dificuldade encontrada pelos colonos foi o relevo da cidade, cheio de morros e cortado principalmente pelos rios Jaraguá e Itapocu. Emílio Carlos Jourdan até tentou fazer com que o rio Itapocu fosse navegável até São Francisco do Sul, mas falhou em todas as tentativas.
Como o trem ainda não era uma realidade (a linha férrea chegou ao Vale do Itapocu apenas em 1913), as poucas estradas de terra eram a única maneira de escoar a produção agrícola dos colonos da região. Geralmente, os produtos eram carregados nos lombos de burros e cavalos. Com a ocupação das terras jaraguaenses por húngaros, negros, alemães e italianos, estradas foram construídas, principalmente com o contorno margeando os rios. Os colonos também construíram pontes nos pequenos afluentes dos rios Itapocu e Jaraguá.
A pequena população da Colônia Jaraguá (estimada em 8 mil habitantes em 1912) dispunha de apenas uma opção para fazer a travessia do rio Itapocu. As águas tranquilas do rio eram transpostas com uma balsa. Para transportar a sua produção, o colono era obrigado a ir até o “trapiche” ao lado do comércio de Jorge Czerniewicz. Com o intenso movimento, o local foi batizado como porto Czerniewcz.
Escoar a produção agrícola era uma questão urgência para os habitantes da colônia. A construção de uma ponte tinha um papel essencial para que os produtos produzidos pelos colonos chegassem aos grandes centros. A primeira estrutura sobre o rio Itapocu foi construída em 1909. A modesta ponte foi feita em madeira e era muito baixa, apenas um metro acima do leito normal do rio. Mas a melhoria não durou muito. Se você achava que as cheias são um problema atual em Jaraguá do Sul, está enganado. A ponte foi destruída por uma grande enchente em 1911.
A primeira ponte de ferro de Jaraguá do Sul
A construção de uma estrutura que ligasse as duas cabeceiras do rio Itapocu talvez fosse a maior necessidade dos colonos nos primeiros anos da década de 10. A segunda ponte construída no rio, com cerca de 90 metros, foi inaugurada em março de 1913 e tem uma história curiosa. A estrutura saiu originalmente da Inglaterra com destino à África do Sul em 1912. Mas o navio vindo do Reino Unido acabou aportando em Florianópolis e a ponte foi descarregada.
O deputado estadual Abdon Batista viu no equívoco a oportunidade de atender a necessidade dos colonos jaraguaenses. Os habitantes da Colônia Jaraguá haviam voltado a utilizar as balsas para a travessia do rio Itapocu desde a enchente de 1911. Batista conseguiu que a ponte permanecesse em Santa Catarina e fosse levada para a colônia no Vale do Itapocu. A ponte de metal tinha piso de madeira e ganhou uma cobertura de zinco em 1925. Com um enorme pilar de pedra, a estrutura foi edificada entre as ruas Hugo Braun, próxima à agência Besc (atual Bradesco), e Max Wilhelm. A peça agora, certamente parece familiar aos leitores (foto 2).
Sra. Odila Pavanello Brugnago compartilhou conosco um depoimento deveras impressionante sobre a obra do pilar, disse ela:
Mestre Emilio da Silva sempre contava a história do “Velho Brugnago”, na verdade Giovanni Brugnago, que era conhecido no Brasil por Domênico (ou “Domingos”, abrasileirado). Foi ele um dos responsáveis pela construção desse pilar. Era exímio na construção de pedras, arte aprendida na Itália, de onde veio com 19 anos para a Colônia Luis Alves. Emílio da Silva contava que Brugnago tinha tanta experiência no trabalho com pedras que calculava o tamanho e em duas ou três viradas elas se encaixavam perfeitamente. Giovanni (Domênico) Brugnago morreu em 1959, no bairro Vila Nova, em Jaraguá do Sul, para onde veio na década de 1920 com a família. Era avô do jornalista Flávio José Brugnago, do Jornal do Vale. Está sepultado no cemitério do Centro ao lado de sua mulher, Rosa, também nascida na Itália. Ele tem inúmeras obras com pedras. Participou inclusive da construção da estrada de ferro inaugurada em 1910.
A construção de uma nova ponte Abdon Batista
A ponte de ferro foi utilizada por cerca de 50 anos. Na década de 60, com a expansão industrial do município, destacando o início do desenvolvimento dos setores têxtil e metalomecânico, percebeu-se a necessidade de fazer a substituição da estrutura sobre o rio Itapocu. Em 1961, através de um convênio com o governo do Estado, começaram as obras para a construção de uma nova ponte de concreto, com cerca de 80 metros. A obra ficou sob os cuidados da construtora Marna, de Pinhais, no Paraná.
Após quatro anos de obras, a nova ponte de acesso a Jaraguá do Sul foi inaugurada pelo prefeito Roland Harold Dornbusch, em 13 de março de 1965, mas já começou a ser utilizada pouco antes pela população. Da estrutura antiga, restou apenas o grande pilar de sustentação em pedra, que até hoje permanece intocado, e pode ser observado da atual ponte Doutor Abdon Batista. O pilar foi tombado pelo decreto número 9.035/12, de 17 de dezembro de 2012, como Patrimônio Histórico Cultural do município.
Sr. Charles Harnack, morador da área na época, deixou um depoimento a respeito dos últimos dias da obra:
Em 1962 a ponte nova foi inaugurada, e aos poucos a de ferro foi caindo em desuso, utilizada apenas por pedestres e bicicletas. Após um tempo foram vendidas as vigas de madeira, e finalmente a estrutura de ferro. Ainda quando havia somente a estrutura, alguém quis arrendar da prefeitura para abrir um restaurante, mas as negociações não andaram.
Não encontramos confirmação oficial, mas estima-se que a ponte, por ter entrado em desuso, não recebeu mais manutenção e em determinado momento foi desmanchada. A foto acima, de 1964, ainda mostra ela de pé, paralela à nova de concreto.
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Sobre o artigo que você leu
“Antigamente em Jaraguá do Sul” é uma série que investiga, resgata e preserva a memória de histórias, rotinas, pessoas e fatos que moldaram a identidade de nossa cidade. Tem alguma curiosidade ou dica que queira compartilhar com a gente?
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