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No palco os músicos alinhados, de terno e gravata, uniforme padrão que mais lembra as primeiras fotos dos Beatles. Mas o som era diferente, dominado especialmente por músicas alemãs.
Na pista de dança, o visual era tão engomado quanto o da banda. Para entrar na maioria das festas, precisava pelo menos usar camisa e calça social, e em alguns lugares até uma gravata. As mulheres de vestido com saia rodada. Ir para um baile em Jaraguá do Sul na década de 60, era como se arrumar para um casamento nos dias de hoje.
As memórias dessa época estão vivas na memória de quem, então, estava na casa dos 20 anos.
Quem não esquece dos bons tempos vividos é Raimundo Piske, hoje aos 67 anos – também pudera, com meros 17 anos ele estava começando a vida de músico junto com a banda Os Marajás. Isso em 1967.
O grupo, um entre muitos que surgiam na região, abria espaço agitando as chamadas domingueiras. O salão não esvaziava um minuto sequer, era o momento da juventude do interior, que na época mal tinha televisão ou rádio, se divertir.
“Todo mundo ia para dançar e conversar”, relembra Piske, que viveu boa parte da vida vendo o movimento dos salões de Jaraguá do Sul e região, e depois de outros estados com a banda Lyra e Aurora.
Vida de músico de interior
Piske tocava trompete e vivia no interior, em Três Rios do Norte, quando foi procurado para integrar a banda Os Marajás – formado por Natalino Menel, Norberto Reck, Joaquim Piazera, Dorinho Pereira, Adolfo Kohls, Lídio Lopes e Jair de Andrade.
Depois, em 72, a banda virou Os Magníficos com a troca de alguns membros por Joaquim Fagundes, Rofino Shulz, Alcir Hornburg e Antonio Vieira. O grupo seguiu até 1991 com outros membros, Piske já tinha passado pelas bandas Lyra e Aurora.
Para tocar, era preciso muito ensaio, claro, especialmente porque era preciso ser “banda para toda obra”. Agradar o público de diferentes lugares, fosse qual fosse a festa.
“Eram dois tipos de ambientes. No Baependi, quando era um baile social, tinha que ter outro repertório. Eles não iam pra suar, tinha que tocar música lenta, fox, foxtrot, baladas. Se nós íamos tocar no interior, lá era pra suar, dançar rápido. Era marcha, marcha e mais marcha”, conta rindo.
Os bailes eram muitos, das típicas festas de chope, de rei e rainha. Até baile de Carnaval, com um sambinha. E, claro, casamentos, que precisava ter de tudo.
Piske conta que a Sociedade Amizade tinha muitas festas, assim como o extinto Salão Alemanha, Cruzeiro, Botafogo, Vieirense – que ficava onde hoje está o Líder Clube – e o salão Baependi – que ficava onde hoje é o Centro Empresarial de Jaraguá do Sul e Scar.
Mas essa rotina de músico não tinha glamour. Piske, por exemplo, ia pros ensaios a bordo da bicicleta nos primeiros anos. Andar entre uma cidade e outra era uma tarefa árdua, já que as rodovias não tinham asfalto.
Os músicos subiam as serras para Pomerode e São Bento do Sul em estrada de chão e com todos os instrumentos dentro do carro, uma Kombi. Ter esses equipamentos de som e até um teclado não era muito comum na época.
“Tinham bandas que tocavam tudo no seco, sem equipamento, sem nada, era tudo no gogó”, comenta.
Do rádio pro repertório
Hoje em dia, facilmente você encontra aquela música legal que ouviu na internet. Nos anos 60, 70, quem queria levar novidades para o salão precisava dar a sorte de conseguir gravar música em uma K7 ou esperar tocar até decorar.
Com um ouvido musical desde cedo, Piske era responsável por transformar o que surgia em partitura para que a banda ficasse atualizada. Depois, os repertórios começaram a mudar, ganhando sertanejo, pop e rock.
Outro ponto de encontro dos músicos era a loja de vinis do Zender, no mesmo local onde ele mantém uma eletrônica até os dias de hoje. Era a única loja de LPs que existia em Jaraguá do Sul naquela época.
Uma relação pessoal com a música
Raimundo Piske exibe nas paredes do escritório um pouco dessa história íntima com o universo da música As capas dos LPs que gravou junto com parceiros em diferentes bandas ao longo dos anos, fotos do coral da igreja que fundou, cartazes de divulgação.
Entre elas, também a foto do avô Hermann Wallow, que morreu muito antes de ele nascer, mas de alguma forma deixou de herança o dom com a música.
Por acaso, o neto também acabou no trompete – na imagem centenária, o avô posa com o mesmo instrumento junto de uma bandinha do Rio da Luz, que não teve o nome gravado na memória.
Talvez daí a origem do interesse inato de Piske em preservar a história e a memória das bandas que animaram a cidade em tempos que já passaram.
“Hoje é tudo tão prático, com um pen drive você tem música para um ano todo”, comenta aos risos.
Foram 43 anos que ele esteve tocando ativamente em bailes com a bandas por onde passou, momentos memoráveis como a sangria do primeiro barril da Schützenfest, shows em Brasília, turnê na Alemanha…
Tudo isso entre o instrumento e a rotina. Para ele, só foi possível graças ao apoio da família, especialmente da esposa.
“Fim de semana na música e na semana horário normal na empresa e não faltava. Chegava 6h em casa no domingo e 7h estava na empresa”, conta.
E valeu a pena pelas boas histórias para contar e, claro, pelo prazer de tocar uma boa música – coisa que ele nunca vai largar. Atualmente, está dedicado com seu acordeon austríaco, uma Steiriche Harmonika.
Sobre o artigo que você leu
“Antigamente em Jaraguá do Sul” é uma série que investiga, resgata e preserva a memória de histórias, rotinas, pessoas e fatos que moldaram a identidade de nossa cidade. Tem alguma curiosidade ou dica que queira compartilhar com a gente?
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